STF começa julgamento que pode reduzir poderes das defensorias públicas

O STF (Supremo Tribunal Federal) deu início hoje, à meia-noite, a um julgamento que pode impactar o acesso de grupos sociais vulneráveis à justiça. Até o próximo dia 22, por meio do plenário virtual, os ministros vão apreciar um pedido do PGR (Procurador-geral da República), Augusto Aras, para tirar das defensorias públicas o poder de requisitar documentos de órgãos e autoridades.

A iniciativa de Aras provocou a reação de várias associações jurídicas e de defesa dos direitos de minorias. Ao STF, as instituições afirmam que o atendimento prestado pelas defensorias à população será seriamente afetado se a mudança passar. A DPU (Defensoria Pública da União) também é contrária à ação da PGR.

“Sem o poder de requisição de documentos, todos os serviços da defensoria vão ficar muito mais lentos”, diz Eduardo Kassuga, presidente da Anadef (Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais). Se a lei mudar, segundo ele, pessoas marginalizadas que hoje procuram a defensoria, às vezes sem nenhum documento à mão, terão muito mais trabalho para enfrentar a burocracia.

“Será bem mais complicado para este público conseguir, por exemplo, reivindicar um benefício negado como o auxílio emergencial. Além de depender que as pessoas obtenham os documentos, as defensorias terão que praticamente dobrar suas demandas na Justiça. O Judiciário, é claro, não deseja isso”, argumenta.

Entre os interessados no processo, que se inscreveram no STF como amicus curiae (nome em latim dado às partes que ajudam a fundamentar os votos dos ministros) estão entidades de defesa do meio ambiente, de familiares de presos, povos indígenas e pessoas em situação de rua.

Nos últimos dias, o coro foi reforçado até pela vencedora do último BBB, Juliette Freire, que é advogada e se manifestou no Twitter em apoio às defensorias. “O fim do poder de requisição vai atingir drasticamente o direito de milhares de brasileiros e brasileiras vulneráveis a terem acesso à justiça de forma igualitária”, escreveu a celebridade para mais de 4 milhões de seguidores.

O processo

Em maio deste ano, Aras protocolou no Supremo 23 processos sobre o tema. Um deles, que estará em julgamento, questiona a lei federal de 1994 que deu à DPU o poder de requisição de certidões, exames, perícias e outras providências de qualquer autoridade público. As demais 22 ações de Aras atacam leis estaduais que dão a mesma atribuição às defensorias públicas locais.

Das 27 unidades da federação, apenas cinco não são alvos da PGR: Goiás, Maranhão, Sergipe, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Os processos relativos aos estados não tramitam junto com a ação de âmbito federal, cujo relator é o ministro Edson Fachin. Uma derrota das defensorias nessa ação, porém, afeta todas as demais, porque as normas estaduais têm como base a lei de abrangência nacional.

Ao Supremo, a PGR argumenta que as leis ferem o princípio da isonomia, porque dão aos defensores públicos uma ferramenta que não é concedida a advogados. Mesmo alguns juristas conhecidos, contudo, vêm se posicionando contra a medida, caso do advogado Augusto de Arruda Botelho, colunista do UOL.

Para Eduardo Kassunga, presidente da Anadef, o poder de requisição dos defensores não causa nenhum desequilíbrio de forças no processo. O motivo, segundo ele, é que a defensoria pública representa pessoas ou grupos em disputas contra o Estado, que é naturalmente o ente mais forte do processo.

“O Estado goza de uma série de prerrogativas processuais para estar em situação de vantagem. E o poder de requisição é usado tão somente em demandas contra autoridades públicas, por isso não há que se falar em nenhum privilégio às defensorias”, afirma.


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