O professor de física John Cramer, da Universidade de Washington, foi um especialista nesse tipo de som hipnotizante. Ele recriou duas vezes o que seria o som do Big Bang, que ocorreu há 13,8 bilhões de anos.
Por meio de cálculos matemáticos, ele produziu um som com altas frequências baseado nas informações do início do Universo enviadas pelo telescópio espacial Planck —que possui detectores tão sensíveis que podem distinguir variações de temperatura em alguns milionésimos de um grau na radiação cósmica.
O efeito é semelhante ao que os sismólogos descrevem como um terremoto de magnitude 9, que faria com que todo o planeta ressonasse. Neste caso, no entanto, o som se espalharia por todo o Universo.
“Como o Universo esfriou e expandiu, ele estendeu os comprimentos de onda para criar algo que se pareceria com o som de um ‘baixo'”, disse Cramer, em 2013.
O som fica mais baixo com os comprimentos de onda esticados. Num primeiro momento, o som ficaria mais alto, mas depois desapareceria gradativamente.
Em 2001, com muito menos informações, ele já havia mostrado como seria o som do Big Bang. Na época, ele usou um programa de computador para transformar os dados de ondas de radiação cósmica em algo que pudesse ser ouvido pelo nosso ouvido.
O som era tão baixo que o cientista teve que aumentar a frequência em 100 septilhões de vezes (que é um 100 seguido de 24 zeros a mais).
Qualquer pessoa pode ouvir o som do Big Bang
Qualquer pessoa pode ouvir, com ajuda de uma TV, os vestígios do evento que supostamente deu início à expansão do Universo. O nome dessa espécie de “fóssil” do Big Bang é radiação cósmica de fundo.
É que, ao sintonizar um canal sem sinal de alguma transmissora, é possível ouvir um chiado típico que, entre outros sons, inclui os ecos do Big Bang.
A radiação cósmica foi descoberta meio que por acaso há cerca de 50 anos, pelos cientistas Arno Penzias e Robert Wilson.
Ao utilizar uma antena para fazer experimentos com micro-ondas, eles perceberam um ruído que atrapalhava as medições e não desaparecia. Chegaram a suspeitar que os culpados fossem os pombos que usavam a antena como vaso sanitário, mas as aves não tinham nada a ver com a história.
Os cientistas trocaram ideias com Robert Dicke, da Universidade de Princeton, que na época estava aperfeiçoando a teoria de George Gamow sobre a explosão primordial. E após os devidos estudos e medições, a radiação cósmica de fundo foi confirmada.
“Eles chegaram à conclusão que essa radiação podia ser detectada em qualquer ponto do Universo”, conta o professor Ernesto Kemp, da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e do Museu Exploratório de Ciências.
Na Lua, na Terra ou em qualquer galáxia distante, ela apresenta um pico de frequência de 160,4 GHz e temperatura de 3° Kelvin, o equivalente a -270°C —já se passaram mais de 13 bilhões de anos com o Universo se expandindo, e a temperatura que antes era de aproximadamente 3000°C agora é de -270°C.
Juntamente com a descoberta de Edwin Hubble sobre a expansão do Universo, a radiação cósmica de fundo constitui um dos grandes pilares da teoria do Big Bang. Tanto que Penzias e Wilson receberam o Nobel de Física em 1978.
Dos pombos ao Planck
Desde que a dupla de cientistas afastou os pombos de sua antena para encontrar os ecos do Big Bang, vários satélites foram lançados para estudar a radiação cósmica de fundo.
O Cobe, da Nasa, levou à descoberta, em 1992, de que essa radiação não é uniforme —ela tem variações minúsculas de temperatura.
Mas o principal instrumento de estudo é o Planck, da Agência Espacial Europeia (ESA, em inglês), lançado em 2009, que conseguiu fazer um mapa detalhado da radiação cósmica de fundo.
Foi com ele que os cientistas descobriram que o Big Bang ocorreu há cerca de 13,8 bilhões de anos, ou 100 milhões de anos antes do que se acreditava anteriormente.