Flavio Migliaccio (1934-2020) atua em uma cena clássica de “Terra em Transe” (1967), de Glauber Rocha. Em um comício alegórico, ele fala depois dos discursos do sindicalista Jerônimo (José Marinho) e do jornalista Paulo Martins (Jardel Filho). Diz: “Com a licença dos doutores, o seu Jerônimo faz a política da gente, mas o seu Jerônimo não é o povo. O povo sou eu, que tenho sete filhos e não tenho onde morar”. Esta cena possivelmente inspirou a escolha do título do documentário “Migliaccio, o Brasileiro em Cena”, mas a ligação umbilical do ator com a história recente do país vai muito além. Ele atuou no Teatro de Arena na década de 1950, no Cinema Novo nos anos 1960 e na Globo nas décadas seguintes, onde participou de mais de 30 novelas, programas de humor, séries, infantis e especiais.
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No bilhete de despedida, encontrado no seu sítio, em Rio Bonito, no Rio de Janeiro, onde morreu, Migliaccio escreveu: “Eu tive a impressão que foram 85 anos jogados fora num país como este”. Impressão errada, muito errada, como o documentário trata de mostrar. As palavras no bilhete refletem o estado de depressão profunda em que se encontrava. Poucos anos antes, Migliaccio já sinalizava, mas com humor, esse desfecho: “Uma pessoa com 80 anos, sem medo de morrer e não acreditando em Deus, tem que ter muita coragem, eu acho. Não é isso? E eu tenho essa coragem”.
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