o mercado de trabalho no boom da IA

Com a chegada do ChatGPT, há cerca de um ano, a Inteligência Artificial (IA) virou o principal assunto em diferentes setores, e o mercado de trabalho não foi diferente. Do lado das empresas, a busca por não ficar para trás em relação aos concorrentes e por cortar custos com a automação. Do lado dos empregados, o medo da substituição por uma máquina.

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À medida que algoritmos avançados e sistemas inteligentes ganham terreno em diversas indústrias, surge a necessidade urgente de explorar as complexas interações entre a IA e os empregos humanos. O Relatório sobre o Futuro dos Empregos 2023 destaca que é esperado que cerca de 23% dos empregos mudem até 2027.

Além disso, o relatório prevê a criação de 69 milhões de novos empregos, com a eliminação de cerca de 83 milhões deles. Apesar do medo de muitos, o relatório sugere que o aumento do acesso digital e a adoção de tecnologia devem criar um crescimento líquido de empregos.

Ao mesmo tempo em que os empregos setores de educação, agricultura e comércio digital devem ter o maior crescimento absoluto, o crescimento mais rápido deve impactar especialistas em IA, aprendizado de máquina e sustentabilidade, além de analistas de inteligência de negócios e especialistas em segurança da informação.

“Uma IA vai tomar meu emprego?”

Com o avanço da Inteligência Artificial, seu impacto no mercado de trabalho torna-se cada vez mais evidente. Um dos principais impulsionadores dessa mudança é a automação de tarefas. O surgimento de sistemas inteligentes capazes de realizar uma variedade de atividades rotineiras levanta questões fundamentais sobre a natureza do trabalho humano e a necessidade de adaptação.

A automação impulsionada pela IA tem o potencial de transformar ou substituir tarefas que são repetitivas e baseadas em regras. Desde operações de linha de montagem até processos administrativos, máquinas inteligentes estão assumindo atividades que anteriormente eram exclusivas do domínio humano. Isso levanta a questão crítica do que acontece com as ocupações tradicionais quando a automatização se torna generalizada.

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Imagem: Stokkete / Shutterstock.com

O Olhar Digital conversou com a Prof. Dra. Alessandra Montini, diretora do LabData, da Fia Business School e com o Prof. Dr. Mauricio Seiji Rezende, líder da equipe de inteligência artificial da SoftPlan. Ambos os especialistas compartilham a visão de que profissões que envolvem tarefas repetitivas estão sob ameaça de substituição pela IA. 

Ao ser questionada se a IA substituirá empregos, Montini não titubeou. “Ah, ela vai. Muitas profissões serão substituídas pela inteligência artificial, não tem como”, afirma a especialista. “Se você faz um trabalho repetitivo, como, por exemplo, um departamento jurídico inteiro, que fica o dia inteiro lendo o contrato, se você é um profissional que não se atualiza, você será substituído por uma inteligência artificial.” 

Seiji também segue a mesma linha.

O que eu responderia é o seguinte, se você tem esse medo, se você está numa profissão e você acredita que sofre algum tipo de ameaça pela inteligência artificial, então você precisa procurar uma especialização, precisa procurar aprender mais. Da mesma forma que algumas profissões antigas. Isso sempre aconteceu, isso não é uma coisa nova. Um dia a gente tinha profissões de pessoas arrastando um arado, chegou um trator e aquelas pessoas não estavam mais ali. Mas a gente precisava de alguém para dirigir o trator. Então assim, da mesma forma como essas coisas vão acontecendo, as pessoas precisam se especializar, precisam estudar.

Prof. Dr. Mauricio Seiji Rezende, líder da equipe de inteligência artificial da SoftPlan

À medida que algumas funções são automatizadas, a demanda por habilidades específicas está se deslocando. Habilidades como pensamento crítico, criatividade e resolução de problemas tornam-se cada vez mais valorizadas. Portanto, a capacidade de os profissionais se adaptarem e adquirirem novas habilidades torna-se imperativa.

“O futuro da inteligência artificial no mercado de trabalho é um futuro que ele, na minha opinião, é muito interessante, ele é muito desafiador, ele é muito empolgante”, afirma Seiji. “Só que pra você fazer parte disso, você não pode ficar parado no tempo, você não pode ficar fazendo sempre a mesma coisa, sem especializar, sem estudar, porque senão você corre o risco, sim, de ter uma inteligência artificial substituindo parte do seu trabalho, parte importante do seu trabalho, ao longo dos próximos anos.”

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Imagem: Miha Creative / Shutterstock.com

Alessandra Montini comenta, inclusive, que muitas vezes tarefas hoje vistas como mais difíceis de profissionais altamente especializados, podem ser as que mais sofrerão com a substituição.

As tarefas mais hard, mais difíceis, estão mais fáceis de você substituir. Agora, de repente, lá no Agro, para fazer uma seleção manual, de repente, de uma soja, de um milho, é mais complicado. Um serviço de pedreiro, uma empregada doméstica, é muito mais complicado a substituir do que esses profissionais formados em grandes universidades, mas que não se atualizaram, ficaram perdidos no tempo, enquanto a inteligência artificial ela está ligada, conectada na internet e ela aprende 24 horas por dia.

Prof. Dra. Alessandra Montini, diretora do LabData, da Fia Business School

A colaboração Humano-Máquina

À medida que a Inteligência Artificial se integra cada vez mais ao tecido do mercado de trabalho, surge uma nova dinâmica na forma como humanos e máquinas interagem profissionalmente. A colaboração humano-máquina não é apenas uma realidade emergente, mas uma estratégia essencial para impulsionar a eficiência, a inovação e a capacidade de adaptação em um ambiente de trabalho em constante evolução.

Montini discute como os profissionais precisam aprender a trabalhar com a inteligência artificial. “Ou você aprende a conversar com ela ou ela vai dominar você. E isso eu estou falando todas as profissões”, afirma a especialista.

Não existe nenhuma profissão que eu falo: ‘a inteligência artificial não vai estar forte entrando’. Até o médico, numa cirurgia, nós já estamos com a cirurgia robótica. Eles usam robôs para poder ser uma coisa menos invasiva. Então, veja, o médico estuda a cirurgia robótica para poder trabalhar uma simbiose homem-máquina. Então, ou eu vou trabalhar homem-máquina ou a máquina vai mandar em mim.

Alessandra Montini

O caso do Ministério Público de São Paulo

Imagem: Song_about_summer / Shutterstock.com

Recentemente, o Ministério Público de São Paulo adotou uma inteligência artificial, para ajudar a identificar as fases processuais. As chamadas Etiquetas Inteligentes eliminaram uma fase do trabalho da promotoria, sendo utilizada para casos de homologação do cálculo de pena, remição de pena e progressão de regime. Esta IA já foi aplicada em mais de 3 mil processos somente nos oito primeiros meses deste ano.

“Esse trabalho foi muito bacana. A gente fez realmente um trabalho em conjunto entre os humanos e a inteligência artificial”, afirma Mauricio Seiji. “Quando um processo chega numa promotoria – e isso vale para um escritório de advocacia ou para uma defensoria pública, enfim, em qualquer órgão de justiça -, um dos primeiros trabalhos que o promotor ou o defensor público ou advogado ou juiz precisa fazer é entender porque aquele processo chegou, qual o motivo, porque aquele processo está ali”, explica ele.

“Então a gente criou algumas inteligências artificiais, que a gente chama de Etiquetas Inteligentes, que elas analisam o processo, olham para os documentos que compõem o processo, os autos do processo, e a partir disso elas identificam qual que é a fase processual, ou seja, porque aquele processo chegou na promotoria, e colocam a etiqueta de forma automática.”

Tais etiquetas estão disponíveis pelo software do Sistema Automatizado de Justiça (SAJ), versão 6, criada pelo Grupo Softplan. Seiji explica como este processo envolve uma parceria entre humanos e IA.

É uma coisa que a Inteligência Artificial Moderna consegue fazer da mesma forma que um ser humano. Ou seja, conseguir identificar o motivo, qual a intenção daquele documento, o que ele pretendia. E aí a partir disso a gente criou essas etiquetas, colocou em produção, e eles usam e automatizam o trabalho deles, ajudam a filtrar, a organizar o trabalho da promotoria. Reduz o tempo que às vezes a promotoria levava para identificar o motivo pelo qual o processo chegou até ali.

Mauricio Seiji Rezende

Atualmente, essa tecnologia é utilizada apenas no Ministério Público de São Paulo, por meio de quatro unidades localizadas em Bauru, Ribeirão Preto, Presidente Prudente e São José do Rio Preto.

Tendências para o futuro do mercado de trabalho com a IA

À medida que entramos uma era caracterizada pela convergência entre IA e mercado de trabalho, vislumbramos um horizonte dinâmico repleto de possibilidades e desafios. As perspectivas futuras desse casamento entre tecnologia e emprego são complexas e multifacetadas, moldadas por avanços contínuos na IA, mudanças nas demandas do mercado e, crucialmente, pela capacidade da sociedade em se adaptar e evoluir.

A automação impulsionada pela IA continuará a se expandir para uma variedade de setores e funções. Tarefas rotineiras e previsíveis serão cada vez mais delegadas a sistemas inteligentes, liberando recursos humanos para atividades que requerem criatividade e tomada de decisões complexas. Esta mudança inevitável exige uma reavaliação constante das habilidades demandadas no mercado de trabalho.

“O impacto e a inteligência artificial tem no mercado de trabalho, tem nas empresas, tem no futuro dos profissionais, ele é um impacto indiscutível, na minha opinião”, opina Seiji. “A empresa que deixar de dar atenção para isso vai perder o trem da história, ela vai ficar pra trás sem dúvida nenhuma. Até porque as suas concorrentes vão adotar essas tecnologias e vão vencer uma eventual concorrência.”

Imagem: NicoElNino / Shutterstock.com

Montini explica que as empresas precisam cada vez mais contratar profissionais altamente qualificados em engenharia e ciência de dados. “Eu tenho um departamento jurídico, um departamento financeiro, um departamento de recursos humanos, você tem que ter um departamento de dados, onde esse departamento vai capturar, armazenar e processar dados,” explica ela. “As empresas precisam ter uma mudança de paradigma, começar a trazer a cultura de dados. A empresa do futuro que vai sobreviver a essa nova era é uma organização orientada a dados.”

Quanto aos empregados, Seiji é incisivo ao afirmar que será necessário se renovar. “Para quem é empregado, para quem é funcionário, o importante é você se dedicar, se esforçar, para se especializar, para aprender mais sempre”, aconselha ele. “E para quem vai escolher uma profissão futura, quem pretende fazer, por exemplo, uma faculdade em breve, também vale a pena você escolher com cuidado, com carinho, quais são as profissões que podem andar junto. Trabalhar bem com a inteligência artificial, construir inteligência artificial ou que não estão de forma nenhuma ameaçadas pela inteligência artificial”.


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